Uma das maiores funções da legislação é regular a atuação do todo-poderoso Estado. Com a legislação, são impostos limites aos agentes estatais para evitar que ajam com abuso de poderes, subjetividades e discricionariedade.
E uma das áreas do direito com maior regulação da atuação Estatal é a tributária. Nada mais lógico; afinal, a principal receita do Estado advém da expropriação da propriedade dos indivíduos, ou seja, os recursos que mantém o Estado em funcionamento são produzidos pelos contribuintes.
Assim, os contribuintes necessitam de regras garantidoras de uma mínima segurança jurídica, exatamente a fim de evitar que aquele poder Estatal lhe exproprie mais do que deveria ou que a arrecadação seja feita sem respeito às regras e procedimentos legais. Independentemente de nossa legislação fiscal ser burocrática e complexa, ela existe e, ainda que a critiquemos, precisamos segui-la enquanto vigente.
Ainda que o contribuinte tenha praticado uma sonegação e, portanto, deva sofrer a cobrança dos valores não pagos, o Fisco Estadual precisa, obrigatoriamente, seguir as regras do jogo. E isso não vem sendo feito aqui no Estado do Espírito Santo, em especial naqueles casos em que há diferença de apuração entre o que foi faturado via cartões de crédito/débito e o que foi declarado à administração pública.
Para proceder com essas fiscalizações, o Fisco Estadual tem o direito legal de obter, perante as administradoras de cartões, todas as informações sobre os faturamentos de determinada empresa. Já foi confirmado pelo Judiciário que isso não é quebra de sigilo bancário, e este não é o ponto deste artigo.
O erro está na forma como esse conteúdo é obtido. Existe um procedimento expressamente previsto na legislação estadual que deve ser respeitado. Somente após finalizado esse procedimento próprio é que as informações obtidas poderão ser utilizadas como base para uma autuação fiscal (novo procedimento administrativo fiscal). Caso contrário, a cobrança da dívida tributária pode ser anulada.
Inclusive, já existe posicionamento do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo reconhecendo a nulidade da atuação (face à não observância das regras legais para obtenção das informações junto às administradoras) e determinando a devolução de todo o valor pago pelo contribuinte.
A correção, pelo Judiciário, do erro do Executivo, é fundamental em casos como esse. Afinal, sonegar é errado sob o ponto de vista legal? Sim, mas os fins não justificam os meios. A segurança jurídica é importante e essencial à democracia, empreendedorismo e desenvolvimento econômico. E o Fisco não pode tudo.