Indo direto ao ponto, ex-sócio não responde pelas dívidas da empresa, ainda que decorrentes do período que era sócio. Sem exceção? Não, sempre tem exceção no Direito, e é a mesma para quem continua sendo sócio: desconsideração da personalidade jurídica, com consequente quebra da autonomia patrimonial.
Voltando ao cerne da questão, o ex-sócio não fica responsável pelas dívidas da empresa. A comunidade jurídica e empresarial faz uma confusão danada sobre a interpretação do artigo 1.032 do Código Civil (Lei 10.406/2002), que diz:
Art. 1.032. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação.
Pela simples leitura, parece que o ex-sócio tem responsabilidade pelas dívidas da empresa pelo período de 2 anos a contar de sua saída. Mas essa é uma interpretação equivocada. Explico.
Se o sócio que continua na empresa não possui responsabilidade por dívidas (lembrando que a pessoa jurídica tem personalidade própria, sendo ela a responsável pelos débitos), por que o sócio retirante teria? É ilógico e seria um contrassenso da lei responsabilizar apenas o sócio que se retira, o que traria inclusive a situação de desestimular pessoas a saírem das empresas pelo “medo de passar a ser responsável pelo que não era antes”.
Mas, no Direito, a “lógica” não basta. Tem a tal da lei, no caso, o Código Civil que, no citado artigo 1.032, fala expressamente em “obrigações sociais”, e não em “obrigações pelas dívidas”, ou “obrigações da empresa”.
E por “obrigações sociais” entenda “obrigações que tinha como sócio”, conforme define o parágrafo único do art. 1.003, também do Código Civil:
Art. 1.003, Parágrafo Único: Até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio.
Alguns exemplos de obrigação de sócio são, por exemplo, a aprovação de contas da administração, as deliberações sociais definidas em contrato social e a integralização do capital social subscrito, situação esta que, inclusive, pode gerar a responsabilidade perante terceiros prejudicados pela ausência de integralização.
Voltando às exceções mencionadas no início do artigo, o sócio deve sim se preocupar com sua responsabilidade após a saída, mas somente nos casos em que, no exercício de suas atribuições como sócio, houver agido de maneira abusiva, desviando a finalidade da sociedade ou fazendo confusão entre seu patrimônio e o da empresa, hipóteses essas que justificam a desconsideração da personalidade jurídica.
Fora isso, o sócio retirante e o remanescente não possuem responsabilidade pelas dívidas. Logicamente, o direito está em constante mutação e a aplicação depende muito de quem interpreta e do contexto analisado. Trouxemos aqui um aspecto técnico para tentar tranquilizar a comunidade empresarial de que o ex-sócio não está preso às dívidas da empresa pelo longo período de 2 anos após saída.
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